João Pais Filipe não é o tipo de músico que “fala mais do que faz” — antes pelo contrário. O artista portuense, que é também artesão do seu próprio e singular kit de percussão, percorreu os caminhos do industrial, do jazz e da vanguarda até encontrar um espaço ainda por ocupar pelos académicos europeus e pelas suas notações musicais. Na sua expressão única, o percussionista dobra as composições musicais até ao ponto em que melodias e harmonias resultam de relações rítmicas, em vez de uma expressão tirânica a impor-se sobre a criação. Filipe desenhou uma nova direção sonora, a que chama ethno techno, onde gere constantes dualidades: entre o mecânico e o orgânico, os loops e as repetições, as explosões de pista e os mantras circulares. A tocar a solo, João Pais Filipe aborda as estruturas da música eletrónica de dança de forma profundamente idiossincrática, canalizando através do seu kit artesanal, concebido e construído por si, cada camada e ideia, conferindo-lhes imperfeições não industrializadas e texturas rústicas, e abrindo um novo caminho para o género.

O seu primeiro álbum homónimo é composto por três peças distintas, marcadas pela sua precisão rítmica quase mecânica, onde reinterpreta o techno, o house e outras estruturas de dança através de padrões circulares e dos timbres naturais, não processados, do seu kit. Uma experiência invulgar em que a musique concrète é reformulada em formatos musicais verdadeiramente comoventes, criados a partir das suas próprias composições polirrítmicas e compassos pouco usuais, mas que oferecem temas relacionáveis e genuinamente emocionais. João Pais Filipe assumiu o lugar das máquinas para perceber se os andróides sonham com ovelhas elétricas — apenas para descobrir que começaram a fazê-lo com o ethno techno.